A Instrução Normativa RFB nº 2121/2022, que consolida as normas sobre PIS/Pasep e COFINS, é um documento de constante análise por contribuintes e profissionais. Recentemente, a Instrução Normativa RFB nº 2264, de 30 de abril de 2025, promoveu uma alteração no Artigo 571 da IN nº 2121/2022, desencadeando importantes discussões sobre a apuração de créditos dessas contribuições. Seus reflexos são significativos para diversos setores, em especial o agroindustrial, atingindo diretamente fabricantes de rações para aves e suínos.
A relevância do tema reside no potencial impacto financeiro e operacional que esta normatização expressa pode gerar. O cerne da discussão está na regra de estorno de créditos básicos da não cumulatividade e sua vinculação a determinadas operações na cadeia produtiva.
Anteriormente, o Artigo 571 da IN RFB nº 2121/2022 (em sua redação original) exigia que as empresas vendedoras de produtos com suspensão da exigência de contribuições (previstos no Artigo 569) estornassem os créditos de PIS/Pasep e COFINS na aquisição de bens utilizados na elaboração desses produtos. Isso incluía, entre outros, os insumos utilizados nas preparações para alimentação de aves e suínos (código 2309.90 da Tipi) e os próprios animais vivos (aves e suínos) vendidos para empresas produtoras de carne. Desta forma, mesmo que os insumos fossem tributados, a apropriação de crédito era vetada e devia ser estornada.
Com a nova redação, o Artigo 571 continua prevendo o estorno de créditos básicos referentes à incidência não cumulativa do PIS/Pasep e da COFINS decorrentes da aquisição de bens utilizados na elaboração ou revenda de produtos com suspensão da exigência das contribuições, previstos no Artigo 569. No entanto, em seu parágrafo único, estabelece uma condição específica para esse estorno: ele se aplica somente no caso de as aquisições decorrentes das vendas efetuadas com suspensão darem direito ao crédito presumido de que trata o Artigo 584.
O Artigo 584 da IN nº 2121/2022 regulamenta o crédito presumido para pessoas jurídicas, inclusive cooperativas, que produzem carnes (classificadas em códigos específicos da Tipi), destinadas à exportação ou vendidas a empresas comerciais exportadoras. Esse crédito é calculado sobre o valor de aquisição de bens utilizados como insumos (como cereais, preparações para alimentação animal e animais vivos). É importante notar que, para as pessoas jurídicas vendedoras desses insumos, é vedada a apropriação tanto do crédito presumido quanto de créditos básicos em relação às receitas de vendas efetuadas com suspensão, com algumas exceções.
É fundamental destacar que a Lei nº 12.350/2010, em seu Artigo 55, parágrafo 5º, já estabelece que o produtor ou vendedor do insumo não poderá se creditar do PIS/COFINS sobre os itens que são diretamente utilizados na fabricação de produtos que irão gerar crédito presumido para o adquirente final. A Lei, por si só, não trazia uma disposição explícita sobre a necessidade de estorno, mas sim uma vedação ao crédito de entrada.
A nova redação do Artigo 571 da nº IN 2121/2022, introduzida pela IN nº 2264/2025, vem, portanto, para disciplinar o que já estava previsto na legislação, esclarecendo a forma de operacionalizar essa vedação e a necessidade de estorno. Isso significa que a obrigação de estornar o crédito recai sobre quem vende o insumo diretamente para a pessoa jurídica que fará jus ao crédito presumido. Em outras palavras, a vedação ao crédito de entrada e a eventual necessidade de estorno se aplicam ao vendedor que faz a venda com vínculo direto à operação que gera o crédito presumido. Essa leitura representa uma mudança significativa no entendimento anterior e, se confirmada e aplicada pelas autoridades fiscais, traz implicações substanciais:
- Estorno Vinculado ao Uso do Cliente: A necessidade de estornar o crédito básico de PIS/COFINS na entrada dependerá diretamente do uso que o cliente dará ao produto adquirido (o insumo).
- Desafio Operacional: Na prática, torna-se um desafio para o vendedor do insumo determinar se o seu cliente se enquadra na situação que gera o crédito presumido. O vendedor apropria o crédito básico na entrada, mas só saberá se precisa estorná-lo no momento da venda, e isso depende de informações sobre a destinação final do produto no cliente.
- Impacto no Setor de Rações e Produtores de Aves e Suínos: Para fabricantes de rações para aves e suínos, ou até mesmo para os produtores desses animais vivos, a consequência direta da nova interpretação é que a necessidade de estornar créditos na aquisição dos insumos para a produção de tais produtos, só se aplica se venderem para clientes (como frigoríficos) que utilizam a ração ou o animal na produção de carnes destinadas à exportação e que, por isso, se beneficiam do crédito presumido. No entanto, se as vendas forem realizadas para produtores rurais, por exemplo, não haverá a necessidade de estornos. Isso, em geral, pode significar uma apropriação de crédito significativa que, antes, ficava perdida devido à antiga regra de estorno.
- Custo efetivo: A possibilidade de manter os créditos anteriormente estornados representa uma redução direta no custo efetivo de produção, alterando a composição do custo dos produtos fabricados ou revendidos. Valores que antes oneravam a atividade ao serem incorporados como despesa passam agora a ser compensados, impactando positivamente a estrutura de precificação, a rentabilidade operacional e a competitividade da operação. Esse efeito financeiro exige reavaliação das rotinas de custeio e dos parâmetros utilizados na formação de preço.
A potencial divergência na interpretação da norma e o risco de questionamentos fiscais por parte da RFB são fatores a serem considerados. Diante deste cenário complexo, torna-se fundamental para as empresas afetadas, especialmente no setor agroindustrial:
- Realizar uma análise aprofundada das operações de venda e aquisição de insumos, em especial, relacionados a industrialização de rações para aves e suínos.
- Verificar para quais clientes são realizadas vendas de insumos (como rações) e se esses clientes se enquadram na situação de direito ao crédito presumido (Artigo 584).
- Reavaliar a apropriação de créditos básicos e a necessidade de estornos, considerando a nova interpretação do Artigo 571 e seu parágrafo único.
- Analisar a possibilidade de levantamento de créditos retroativos.
A alteração do Artigo 571 da IN RFB nº 2121/2022, promovida pela IN RFB nº 2264/2025, transcende uma mera modificação textual: ela representa um convite à reavaliação estratégica das operações fiscais, especialmente no dinâmico setor agroindustrial. A intrínseca relação entre o estorno de créditos e o direito ao crédito presumido, agora mais explícita e disciplinada pela IN, exige das empresas uma compreensão aprofundada da jornada de seus produtos na cadeia produtiva e das implicações fiscais em cada elo.
A complexidade inerente a essa nova abordagem, especialmente no que se refere à necessidade de rastrear o uso final dos insumos realizada pelos clientes para determinar a elegibilidade do próprio crédito, ressalta a urgência de aprimorar os sistemas de informação e a comunicação entre as partes envolvidas. Em um cenário tributário que se reinventa constantemente, a adaptação proativa a essas mudanças é essencial para uma gestão fiscal eficiente e para garantir a segurança e a competitividade do negócio.
Por
Renata Partele


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